COP30: Protestos expõem contradições da política ambiental brasileira e marcam dias intensos de negociações globais em Belém
- Observatório das Baixadas

- 11 de nov.
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[COP 30]

Ocupação da entrada da Blue Zone e críticas ao TFFF marcam o segundo dia da COP30
A noite de terça (11), encerrou o segundo dia da COP30 com tensão e simbolismo. Um grupo de manifestantes da Marcha Global pela Saúde e pelo Clima, formado por integrantes do Baixo Tapajós, Movimento Juntos, Juventude Ecossocialista e outras organizações socioambientais, rompeu o bloqueio de segurança e realizou uma ocupação simbólica da área de acesso às negociações oficiais da ONU.
A mobilização teve fortes críticas ao TFFF (Tropical Forest Forever Fund) — fundo lançado pelo governo brasileiro com promessa de captar bilhões para proteger florestas tropicais, mas acusado pelos movimentos e organizações de carecer de transparência e concentrar recursos em iniciativas de mercado de carbono, sem garantir protagonismo das populações amazônicas.
Os manifestantes também denunciaram a contradição entre o discurso climático do governo e projetos que ameaçam a Amazônia, como a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas e o avanço da hidrovia do Tapajós, apontada por ambientalistas como uma nova fronteira de destruição de ecossistemas e territórios indígenas.
Com faixas, cânticos e performances, os grupos exigiram coerência entre as promessas feitas nos palcos da COP e as decisões tomadas no território, ecoando o grito:
Sem Amazônia viva, não há justiça climática
Na plenária de abertura, o secretário executivo da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC), Simon Stiell, fez um apelo aos países: “O trabalho de vocês aqui não é lutar uns contra os outros — é lutar juntos contra a crise climática.” Ele admitiu que ultrapassar temporariamente o limite de 1,5°C é inevitável, mas reforçou que a trajetória pode ser revertida se as nações acelerarem a transição energética e cumprirem o prometido em Dubai, durante a COP28: triplicar a geração de energia renovável e dobrar a eficiência energética global.
Já o presidente Lula celebrou a primeira COP da história realizada na Amazônia, descrevendo o feito como um gesto político de coragem e necessidade. O novo Parque da Cidade, construído sobre um antigo aeroporto de Belém, foi apresentado como símbolo de transformação urbana e ambiental, embora muito criticado sobre o contraste entre a infraestrutura da conferência e as condições precárias das comunidades de baixada próximas. Lula destacou que 20% da população amazônica vive abaixo da linha da pobreza e que trazer a conferência para a floresta era uma forma de o mundo enxergar os desafios enfrentados por quem a defende.
Os povos indígenas tiveram presença marcante, com a maior participação já registrada em uma COP. Lideranças como Fany Kuiru Castro, da COICA, e Célia Xakriabá cobraram que o texto final da conferência inclua salvaguardas obrigatórias aos direitos territoriais e reconheça a demarcação de terras indígenas como instrumento fundamental de mitigação climática. “Sem o respeito aos nossos direitos e sem nossa participação, não há solução para a crise climática”, declarou Kuiru. As organizações também exigiram que o Programa de Transição Justa proíba mineração em terras indígenas e assegure o direito de consulta prévia e informada sobre qualquer projeto energético ou de infraestrutura.
Enquanto isso, a ONU apresentou novas projeções sobre as metas climáticas nacionais (NDCs): somadas, elas resultariam em apenas 12% de redução das emissões até 2035, muito aquém dos 60% necessários para manter o aquecimento dentro do limite de 1,5°C. México e Coreia do Sul anunciaram planos mais ambiciosos, com cortes de até 61%, enquanto Índia e Arábia Saudita foram criticadas por ainda não apresentarem compromissos. No campo do financiamento, o Fundo de Perdas e Danos, criado em 2022 e operacionalizado agora, lançou seu primeiro edital com US$ 250 milhões disponíveis — um valor considerado irrisório frente à necessidade global estimada entre US$ 200 e 400 bilhões anuais até 2030. Países do Sul Global denunciaram a falta de compromisso das nações ricas e defenderam que os recursos sejam acessíveis diretamente às comunidades afetadas.
Delegações africanas também pressionaram pela implementação efetiva do novo objetivo de financiamento climático global, de US$ 300 bilhões por ano até 2035, destacando que o continente não pode assumir novos encargos sem apoio financeiro. “A África não pode continuar sendo tratada apenas como vítima, enquanto os países ricos decidem quem merece ajuda”, afirmou o enviado especial Carlos Lopes.
Os primeiros dias da COP30 revelaram o contraste entre a diplomacia e as ruas. Enquanto chefes de Estado e negociadores debatem metas e prazos nas salas climatizadas da Blue Zone, as margens do Hangar se tornaram palco de protestos que expõem as contradições entre discurso e prática. A ocupação da entrada da Blue Zone encerrou o dia 11 com um recado direto: a Amazônia não é apenas cenário da conferência, mas sujeito político da crise climática — e seu povo exige ser ouvido.


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